Valter Vanir Coelho, começou no teatro amador aos 12 anos de idade, depois de inúmeros cursos fundou sua própria Cia teatral, a Cia Sem Máscaras, e com ela dirigiu e atuou. Mas em 2002 ele decidiu por uma paixão incontrolável levar suas peças pra rua, mais de 10 peças depois, 12 prêmios de Melhor Ator e outros 23 de Melhor Diretor, e incontáveis outros prêmios técnicos em Festivais de Teatro, seus espetáculos conquistaram o Premio Panamco/Coca-Cola de Teatro Juvenil, e também o importante Premio Jorge Amado de Dramaturgia. Fora de sua Cia, Vanir atuou em peças de Zeno Wilde, Ademar Guerra, Renato Borghi, etc. Se formou em Cinema e produziu alguns curtas-metragens, foi assistente em outros 7 filmes e atuou em alguns longas como Olga, O Casamento de Romeu e Julieta, protagonizou o filme O Judeu (2009), de Breno Silveira, que está sendo finalizado. Valter é um homem das artes, e também se dedica a multiplicar seus conhecimentos oferecendo Oficinas de Teatro e de Cinema desde 2000 em diversas cidades e instituições de Cultura. Abaixo, os jovens atores Vinicius Dias e Bruno Carvalho (da Cia Tripoloucos de Teatro) entrevistam esse ícone do teatro de grupo, tentando arrancar dele algumas curvas do fazer teatral, já que esses meninos estão no frescor da confecção de um novo espetáculo:
1° Quais são as suas expectativas para as apresentações em Porto Alegre?
As melhores possíveis, tenho um relação muito carinhosa com Poa, lá nossas peças sempre foram muito bem, e podemos dizer que temos uma galera que acompanha nosso trabalho, uma espécie de “fã-clube”, hahahha. Fóra que Porto sempre foi um pólo de teatro de rua, estou ansioso (mesmo que Lulu não seja propriamente de rua) estou ansioso pra saber o que minha “antiga turma” achará dessa minha nova empreitada.
2° Por que o titulo da peça? Do que ela trata?
Lulu Minada fala da situação das crianças em Angola. Crianças que convivem com minas terrestres (uma enormidade delas são mutiladas), que vivem em campos de refugiados, esgotos, seca, miséria. Um lugar onde o abuso infantil ainda não é classificado como crime. Lulu Minada conta a história de uma menina que acha que se transformando em sua boneca sua vida será mais feliz. Típico argumento de peça infantil, mas tocamos em assuntos muito pesados, proibidos mesmo para “criancinhas”, essa menina já foi abusada, vive num acampamento, no meio de uma guerra civil. E ainda convive com a falta de luz. Por isso a brincadeira com o título: Lulu Minada (falando rápido parece iluminada, e minada vem de mina, mina terrestre.)
3° O cenário da peça é um show a parte, como surgiu a idéia?
Eu assisti uma entrevista que uma menina angolana dizia que numa visita a Africa do Sul, a coisa que mais ela tinha gostado era a quantidade de lâmpadas, luz elétrica. Daí nasceu esse premiadíssimo cenário do artista plástico Tuca Coelho.
4º Como foi o processo de montagem da peça?
Eu definí que o resultado dessa peça seria outro se também ousasse na escolha da atriz, queria alguém que tivesse apenas o referencial do teatro infantil. Foi aí que escolhi a Dorinha Santana, ela trabalha a anos como palhaça, o jogo entre adulto e infantil estava sendo levado as ultimas conseqüências. Apesar das dificuldades normais de uma direção, achamos logo de cara o tom correto, a jocosidade necessária, o blefe infantil. O processo foi tranqüilo, apesar de tocar em assuntos tão duros. O mais cortante foi mesmo a pesquisa, assistir depoimentos e reportagem de crianças tão maltratadas pela vida foi a pior parte, mas não dava pra fugir disso, gosto da pesquisa, ela salva as peças da mediocridade.
5° Fale um pouco sobre seu começo na carreira. O que foi mais difícil?
Não teve nada difícil para começar. Foi natural, eu era coroinha (risos), um belo dia ouvi no rádio que teria um curso de teatro gratuito com profissionais, fui e não pude me inscrever, insisti e me deixaram fazer um teste (acho que com a intenção de dispensar aquela criança), acho que fui bem no teste, porque mesmo sendo idade mínima 16, eu com 12 fui aceito. Aí deixei o altar e fui pra outro palco. Nunca mais parei. Isso como ator. Mas teve outros inícios: Como diretor, como produtor, como crítico, como artista de rua, como circense, como tantas coisas. Acho que o que me faz sobreviver é estar tantas vezes com o frio abdominal dos inícios, dos desafios.
6° Como foi participar de tantos festivais? Até os internacionais?
Festivais são montanhas russas. A gente fica na expectativa quando inscreve, faz festa quando passa, morre de medo quando se apresenta, se irrita com os jurados (risos), torce para ser premiado e fala aos quatro cantos que ganhar prêmio não importa, pura mentira. Mentira necessária. Há muitos grupos e artistas que se negam aos festivais, porque sabem dessa via crucis de sentimentos. Eu sempre gostei, talvez por isso somos tão arroz de festa. Hoje somos mais convidados para abrir ou fechar festivais, que também tem seu charme. Já os internacionais nos enchem de orgulho, saber que um texto, uma peça que você começou tão artesanal, de uma leiturinha despretensiosa, acaba agradando e despertando interesse em pessoas com culturas tão diferentes, nossa... E trocar figurinhas e fazer amigos é a melhor parte nessa vida de festivais. É festa.
7° A participação em festivais facilita o crescimento da cias, quais suas dicas para as cias conseguirem participar desses festivais?
Posso dizer que a Cia Sem Máscaras basicamente fez seu nome em festivais, sim ajuda muito. Porque vc tem a oportunidade de trocar experiências, festival é uma vitrine qualitativa, pena que os festivais agora sigam uma mesma linha de escolha, até pelo uso de curadoria, que limitam a um único gosto, as vezes de um ou dois críticos, tenho saudades daqueles festivais com imensa diversidade, com vários estilos, e sem tema, não esses limitados e as vezes até chatos. Festival tem de aguçar o que é artístico, gerar muita discussão, mostrar caminhos e não mostrar também. Dicas? Não sou bom de dicas. Acho que tudo parte do começo, um bom texto. Só existe bons espetáculos partindo de um bom texto. Eu se posso dar uma dica é caprichar na escolha do texto, se vc parte de um bom texto, tudo acaba ficando como apêndice, um bom texto disfarça até um ator mediano. Mas nem uma Laura Cardoso, uma Bibi, uma Fernandona ou um Jhone Sccarpante (risos), nem esses monstros salvam um texto mediano. Depois da escolha de um excelente texto, aí é só cuidar dos detalhes... Claro que para entrar em festivais boas fotos, uma boa filmagem e um bom material ilustrativo ajudam, até pq tem muitos festivais que assistem seus primeiros 15 minutos do DVD e apenas folheiam seus materiais.
Estou iniciando um projeto de formar novos diretores, principalmente especializados em teatro de rua, que tem outra vibe, outra pegada diante do de palco. Estou com alguns projetos que me limitam em dirigir tudo da Cia. Hoje péco pela minha paternalidade excessiva de antes. A Cia nesses 13 anos virou uma empresa, com nota, faturamento, administração e tal, então meu trabalho como líder às vezes se parece a um gerente de uma empresa qualquer. No dia a dia me vejo mais entre documentos, darfs e editais do que a textos, figurinos e atuações. Mas é o preço né?
9° Qual seu conselho para novos atores e diretores?
Para um diretor além da escolha do texto é se apegar aos detalhes de uma produção, o acabamento. Não descansar nunca, enquanto cada fiapo do figurino, cada cantinho do cenário e cada fala de cada ator não estiverem perfeitas, ou pelo menos, te dando orgulho. O bom diretor não é o ditador e sim o que sabe o que fala e aí propõe aos seus companheiros. O bom diretor joga junto. Já para os atores aconselho desistir, não fazer, sair disso o mais rápido possível. Faça o possível e o impossível para deixar essa profissão e se não conseguir, mesmo depois de ter tentado tudo, aí beleza, quem sabe você possa um dia ser ator.
10° Pra finalizar, diga como você acredita que o teatro pode influenciar na vida das pessoas?
O teatro tem o poder de ser ouvido né? As pessoas vão ao teatro ainda para ouvirem, verem, sair de lá com algo que possa ser inesquecível. Mesmo uma grande bobagem, quando é vista em cena, ganha uma grandeza, adquire um aspecto de arte, e arte muda coisas né? Muda desde estados de humor até personalidade. Eu já saí de peças totalmente modificado e tenho a imodesta impressão de que já marquei a vida de pessoas, mesmo que elas não saibam exatamente disso. O teatro faz pensar e também faz calar, ainda!
Entrevista especial para o site: Teatro de Grupo www.teatrodegrupo.com.br
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